ARTIGOS
Dignidade humana e reorganização social
ANTÔNIO SILVEIRA RIBEIRO DOS SANTOS
Juiz de direito em São Paulo. Criador do Programa Ambiental: A Última Arca de Noé (www.aultimaarcadenoe.com)
Dignidade vem do latim dignitate e pode ser definida como honradez, honra, nobreza, decência, respeito a si próprio, conforme O Novo Dicionário Aurélio e Minidicionário Aurélio, ambos da Editora Nova Fronteira, e está ligada ao ser humano por uma abstração intelectual representativa de um estado de espírito.
A dignidade, por conseguinte, é um atributo humano sentido e criado pelo homem e por ele desenvolvido e estudado, existindo desde os primórdios da humanidade mas só nos últimos dois séculos percebidos plenamente, apesar de que quando o ser humano começou a viver em sociedades rudimentarmente organizadas a honra, honradez e nobreza já eram respeitadas pelos membros do grupo, o que não era percebido e entendido concretamente, mas geravam destaque a alguns membros.
No correr dos séculos com o crescimento desordenado das populações humanas e seus inventos, os quais originaram guerras de dominação, surgiram os povos dominantes e os dominados em grande escalas: os livres e os escravos. O homem passou a dominar outros homens, sobrepujando-se reciprocamente.
Então a dignidade humana respeitada naturalmente pelas sociedades mais rudimentares passou a ser desrespeitada e aviltada, impondo aos oprimidos e escravizados as mais indignas situações com a degradação de suas culturas, a negação de sua liberdade, desnorteando-os para a vida, o que podemos observar na catastrófica destruição das etnias ameríndias com a descoberta do Novo Mundo pelos europeus.
A dignidade humana nunca foi tão aviltada como nesta época dos " grandes conquistadores " , pois civilizações inteiras que viviam livres em suas terras foram humilhadas, aniquiladas ou escravizadas, isso tudo sem contar a vergonha da escravidão negra quando milhões de homens do continente africano tiveram sua dignidade totalmente desrespeitada pelos dominantes, apesar de se rebelarem bravamente por séculos, conforme registra Clóvis Moura (Rebeldia das Senzalas, Editora Mercado Aberto, 1988, RJ).
Portanto, a dignidade humana foi desrespeitada por todo o nosso " mundo civilizado" , apesar de homens com grande visão humanista como Russeau e Joaquim Nabuco, entre outros, levantarem suas vozes contra esta condição humilhante. Por seus escritos e ensaios filosóficos levaram e levam a sociedade humana a raciocinar sobre este grande problema social.
O ser humano como ser histórico que é cria seu mundo a sua volta e seus valores como a liberdade, sendo esta afeta a todos desde o mais rico ao mais pobre, pois faz parte de sua natureza: a natureza humana.
Tendo como denominador comum a liberdade e consequentemente o respeito a ela, as sociedades humanas devem ser constituidas e organizadas sobre o reconhecimento deste anseio mundial; devem formar uma sociedade " humanizada" , observando este valor intrínseco do homem. A dignidade só é possível com a liberdade, porque somente o homem livre é digno, pois terá reconhecida sua honradez, a sua nobreza de ser humano. Mas para que possa haver uma humanização total e abrangente, devem todas as organizações sociais humanas reconhecer seus membros por seus atributos intrínsecos humanos, e não pelos seus atributos materiais externos como riqueza material.
Como sabemos, não há mais a escravidão clássica que é a subjugação total do homem pelo homem com a repugnante transformação do ser humano em objeto passível de propriedade de outro, mas temos ainda a degradante desigualdade social com a existência de classes dominantes e classes dominadas, bem como pessoas dominantes e pessoas dominadas pela tecnologia, economia etc, gerando um vasto desnível social.
Se compararmos os séculos passados a situação humana melhorou, evidentemente, mas ainda há uma grande opressão à dignidade humana, pela dificuldade das pessoas terem oportunidades de melhoria de suas condições de vida e mesmo de poderem obter o mínimo de dignidade, mormente pela grande distinção de classes em decorrência do descontrole econômico.
Como bem salientado por Manfredo A. de Oliveira (Ética e racionalidade moderna, Ed.Loyola, pg.110/111), é indispensável que haja uma elevação da consciência individual, da consciência universal, se quisermos ter uma sociedade universalmente livre. Não se trata de ideologia política ou partidária, mas se quisermos ser realmente humanos em toda a plenitude da palavra devemos repensar os nossos valores e elevar o respeito à nossa dignidade ao máximo, e assim estudar e pôr em prática uma nova organização social. Reorganizar a nossa sociedade tendo como pilares a Justiça Social e o respeito ao direito à dignidade de todos os seus integrantes, observando e respeitando a liberdade individual e principalmente a consciência social de bem servir à causa comum.
Em nossa Constituição Federal encontramos importantes artigos nesse sentido como o art.1º, inc.III, que coloca a dignidade da pessoa humana como fundamento da República; art.3º, inc.III que põe como objetivos fundamentais, entre outros, a erradicação da pobreza e da marginalização a fim de reduzir a desigualdade social e regional; art.5º, caput, que coloca todos iguais perante a lei, e seu inciso III, que proibe a tortura, o tratamento desumano ou degradante; art.6º que determinada a assistência aos desamparados; art.193 que dá como base da ordem social o bem estar e a justiça social e, por último, art.231 que reconhece aos índios sua organização social como um todo, protegendo-os.
Portanto, vemos em nossa Carta Magna amplos dispositivos legais que protegem a dignidade humana, faltando colocá-los realmente em prática. Finalmente podemos concluir que uma sociedade somente poderá existir plenamente se representar os anseios de todos os seus cidadãos e respeitar seus direitos fundamentais, incluindo aí o direito de se ter uma vida digna.
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